Na Fundição de Oeiras, Joana Vasconcelos tem um grande atelier com áreas de trabalho diferentes, onde há muito espaço para as peças que ainda não vendeu e que vai levando a algumas das exposições no estrangeiro. Na agenda de 2007 já marcou a passagem por cidades como Istambul, São Francisco ou Miami. "As peças vêm quase todas para aqui para serem montadas", explica a escultora de 34 anos, uma das artistas mais internacionais da sua geração e a autora de A Noiva, o grande lustre feito com 20 mil tampões e aço inox que no ano passado abria a exposição principal da Bienal de Veneza.No atelier, que lhe foi cedido há três anos pela Câmara Municipal de Oeiras, depois de ter ganho o Prémio Marquês de Pombal para jovens artistas, Joana Vasconcelos tem madeiras empilhadas junto a uma parede, prateleiras e prateleiras de caixotes, obras espalhadas por toda a parte. "Este é um dos lugares fundamentais do meu dia", diz, falando de uma rotina marcada por reuniões com colaboradores permanentes (tem três) ou pontuais, idas ao atelier do Bairro da Boavista, o primeiro que teve, ou à Metalúrgica de Algés, onde parte das suas peças que envolvem metais são feitas pelas "mãos valiosas do sr. Manuel e do sr. Vítor", que a acompanham desde o início."É muito importante para mim saber que hoje posso trabalhar com várias pessoas, mas é também uma grande responsabilidade", reconhece, olhando para as duas colaboradoras que cuidadosamente vão colando talheres de plástico num grande coração preto inspirado na arte da filigrana. "Há muitas coisas que dependem de mim e isto de ser escultor não é uma profissão que se procure nos classificados dos jornais. É um processo. Hoje sou artista, mas amanhã posso não ser."A artista tem uma visão pragmática da sua actividade e analisa com frieza o comportamento do mercado no que diz respeito à circulação de obras de arte contemporâneas. "Tenho uma relação complicada com o mercado português, não é graças a ele que sobrevivo. Portugal gosta pouco de comprar Joana Vasconcelos." É no esforço de internacionalização que a artista tem apostado: exposições individuais em Madrid, S. Paulo ou Paris; colectivas em Nova Iorque, Tokamachi (Japão) ou Oslo. Sem esquecer Portugal, onde inaugurou há pouco tempo uma instalação em que subverte a cultura clássica e junta as ninfas de A Ilha dos Amores, de Camões, ao deus Baco, cobrindo de croché (técnica que usa habitualmente) uma série de esculturas kitsch de jardim (Museu da Electricidade, até 1 de Outubro). Joana Vasconcelos terminou o curso de artes plásticas do Ar.Co em 1996 e desde então não tem parado de organizar exposições. No início fazia quatro ou seis por ano, hoje chega às 12 e tem de recusar alguns convites. Apesar da presença em museus estrangeiros - está agora a preparar a sua participação numa colectiva que vai passar por três cidades mexicanas em 2007 -, lamenta não estar mais representada nas colecções portuguesas (a Gulbenkian não tem peças suas e a Fundação de Serralves tem apenas uma, "pequena"). "Tenho mais obras nas privadas do que nas públicas", diz, dando como exemplo a Colecção António Cachola, a do futuro Museu de Arte Contemporânea de Elvas. Porquê? "O mercado está habituado a que os artistas ofereçam sempre o mesmo produto e chega a reagir mal quando isso não acontece", comenta, acrescentando trabalhar materiais diferentes é absolutamente fundamental. "Talvez a versatilidade seja um dos dados mais importantes nas minhas peças. Estou sempre à procura porque tenho medo de cair na tentação de repetir a fórmula. Seria fácil passar do lustre de tampões à sanita-pensos-rápidos, mas isso não me deixaria satisfeita. Na pintura é mais difícil variar do que na escultura, onde as possibilidades são hoje quase infinitas."Aos que a acusam de criar peças imediatistas, responde: "Acho que elas comunicam de forma directa com as pessoas, mas isso não quer dizer que sejam simples ou imediatistas. Se ficam na memória e se complicam o sistema de quem as vê, não podem sê-lo."Gostando de perceber o que fica na cabeça dos espectadores, diz com frequência que hoje trabalha mais as ideias do que os materiais e que as suas obras nascem no caderno que traz consigo. É provável que a que está a preparar para a cafeteria da Casa da Música, e da qual não quer adiantar pormenores, tenha já um esboço nas suas páginas. Os ingredientes deverão ser os de sempre: materiais do quotidiano que, através de um imaginário marcado por temas das cultura portuguesa ou pela arquitectura, ganham outra dimensão nas mãos da artista. Flores do Meu Desejo (1996), Ponto de Encontro (2000), A Noiva (2001), Burka (2002), Coração Independente (2004) e A Ilha dos Amores (2006) são disso exemplo. "Sou muito observadora. Estou sempre atenta aos pormenores, aos desvios no detalhe, às coisas que não batem certo ou estão simplesmente fora do lugar", resume, dizendo ser influenciada por tudo o que a rodeia. "No Coração Independente fui buscar a filigrana dos corações de Viana porque queria um "ícone" do luxo português, queria pegar numa peça de prestígio ligada ao universo popular e trazê-la para a contemporaneidade."Joana Vasconcelos tem já preparado um calendário de exposições até 2008, onde Portugal não está ainda inscrito. A artista plástica vai mostrar o seu trabalho nos Estados Unidos, Turquia, Brasil, Áustria e Reino Unido. "Sou responsável por outras pessoas e tenho vários projectos em simultâneo. Preciso de ser organizada, pragmática." Lucinda Canelas, Público, 13.08.2006
agora vou-te cortar a língua para aprenderes a cantar, adília lopes
domingo, 15 de junho de 2008
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário