agora vou-te cortar a língua para aprenderes a cantar, adília lopes
segunda-feira, 31 de agosto de 2009
domingo, 30 de agosto de 2009
A cultura
Joaquim Manuel Magalhães
sábado, 29 de agosto de 2009
c a s a | ADÍLIA LOPES
por ADÍLIA LOPES
Texto propositadamente escrito para a exposição e catálogo de desenhos de construção com casa . e céu de Carlos Nogueira.
«Casa» faz-me lembrar em primeiro lugar o Imperativo do verbo casar. Penso em Português. Imagino um pai tirano que aponta o dedo ao filho, estão pai e filho de fato completo escuro, e o pai manda:
– Casa!
É uma cena de palco velho com pó, que nada tem a ver com a casa atravessada pela luz de que fala o Carlos Nogueira.
A casa do Carlos Nogueira, para mim, é um espaço para rezar. Para pedir paciência e lágrimas. Porque podemos calcular as dimensões da mesa e da cadeira mas as recordações, as recordações do que foi e do que há-de ser, a angústia e a alegria, não as podemos prever, calcular.
Não me é possível falar das peças que vão estar na exposição sem ser sob a impressão muito forte do espaço em que as vi pela primeira vez: a casa do Carlos Nogueira.
Uma casa é só tecto e chão e o primeiro verso do poema de Sophia de Mello Breyner Andresen intitulado «Electra»: «Os muros da casa dos Manon escorrem sangue».
Sempre a casa são os laços de sangue e a burocracia associada ao sangue: as partilhas e não a partilha. Que a casa seja o lugar da renúncia às coisas inúteis. A casa ideal para mim é uma casa despojada de coisas. Poucos livros, poucos móveis e muitos gatos.
As cores do Carlos Nogueira são boas cores: o branco e a noite. E a forma é o paralelepípedo.
À volta há árvores, perto está o comboio e o mar. Podemos escutar o silêncio e a luz. Penso numa igreja, penso em arte sacra. O Carlos Nogueira pensou a casa dele e pensou as peças para a exposição como pensou a casa. Enquanto dispunha no chão os blocos de ferro e madeira, ouvíamos no gira-discos Maria Callas. Eu lembrei-me da Medeia de Pasolini, em que Maria Callas permanece muda para dar um grito e só ouvimos a sua voz ao dar esse grito – que não é voz, é grito.
Aqui tudo é ordem, mesmo o caos tem leis e sabe-se quais são. Há leis. Eu nunca penso a casa. O Carlos Nogueira pensa a casa. Planeia. Arquitecta. Eu vivo instante a instante, como quem vai a cair por uma escarpa e se agarra a tufos de ervas para não cair tão abruptamente. Não premedito. E, se medito, é com aflição. Para mim, a casa é construída de dentro para fora. Vim ao mundo na casa e a casa era o mundo. O Carlos Nogueira raciocina como eu imagino que um construtor de catedrais raciocinou. Eu não sou assim.
Falo em catedrais, mas devia falar em conventos. Conventos com celas. Se soubesse Biologia, falava em células. A casa é o quarto, o quadrado, o rectângulo, o cubo, o paralelepípedo. Um ovo também é uma casa, basta pensar em Brancusi. Uma célula, uma cela.
A casa é uma fortaleza como o convento e a catedral. É um espaço de segurança. Mas o abismo está lá. Vive-se perto do abismo. Convive-se com o abismo.
E é preciso pagar a casa e o abismo. A electricidade e o curto-circuito e as infiltrações de água e o incêndio e o seguro e a insegurança.
O que penso sobre estas peças que o Carlos Nogueira quer mostrar, e que tenho tentado fixar aqui por escrito, reduz-se ao título de um poema de Fernando Pessoa «A casa branca nau preta» e aos últimos versos do poema cujo título é esse: «A casa branca nau preta…/ Felicidade na Austrália…». Penso em Português e penso em versos.
A esgrouviada Marianna Alcoforado, a despassarada Marianna Alcoforado, melhor será dizer a apaixonada Marianna Alcoforado, que ama perdidamente como a Florbela Espanca dos sonetos, ia sentir-se bem nesta cela, nesta casa do Carlos Nogueira. Charneca em flor, charneca em fogo e um chão de ladrilhos pretos e brancos como um tabuleiro de xadrez. Deve ser bom ser inteligente e jogar xadrez aqui e tocar cravo e estudar Mecânica Clássica.
A janela devia ter grades como a do Convento de Beja de que os turistas japoneses tanto gostam.
A freira raciocina e apaixona-se. Não há calma nisto. Mas sem paciência não há ciência.
A casa é um espaço para rezar. Para pedir paciência, cinzas e lágrimas. Não há nisto luxo nem volúpia. E não digo sequer que haja beleza.
Na minha biblioteca baralhada, não encontro os poemas de Baudelaire. E estive a citar de cor um poema de Baudelaire, julgo que foi «O convite à viagem».
Da casa do Carlos Nogueira afinal nada sei, mas gostava de acabar de arrumar a minha casa. A minha casa é o convite a ficar, é o convite a não viajar. In Carlos Nogueira, desenhos de construção com casa . e céu, Almada, Casa da Cerca - CAC, Maio 2006, p. 48-53.
sexta-feira, 28 de agosto de 2009
quarta-feira, 26 de agosto de 2009
terça-feira, 25 de agosto de 2009
Le Nez / The plastic surgery (Sophie Calle)
"When I was fourteen my grandparents suggested that I needed plastic surgery. They made an appointment with a famous cosmetic surgeon, and it was decided that my nose should be straightened, that a scar on my left leg should be covered up with a piece of skin taken from my ass and that my ears should be pulled back. I had my doubts, but they reassured me, I could change my mind up until the very last moment. In the end, though, it was Doctor F. himself who put an end to my dilemma. Two days before the operation he committed suicide." Sophie Calle
segunda-feira, 24 de agosto de 2009
St. Roach, | Muriel Rukeyser
St. Roach, | Muriel Rukeyser
For that I never knew you, I only learned to dread you,
for that I never touched you, they told me you are filth,
they showed me by every action to despise your kind;
for that I saw my people making war on you,
I could not tell you apart, one from another,
for that in childhood I lived in places clear of you,
for that all the people I knew met you by
crushing you, stamping you to death, they poured boiling
water on you, they flushed you down,
for that I could not tell one from another
only that you were dark, fast on your feet, and slender.
Not like me.
For that I did not know your poems
And that I do not know any of your sayings
And that I cannot speak or read your language
And that I do not sing your songs
And that I do not teach our children
to eat your food
or know your poems
or sing your songs
But that we say you are filthing our food
But that we know you not at all.
Yesterday I looked at one of you for the first time.
You were lighter that the others in color, that was
neither good nor bad.
I was really looking for the first time.
You seemed troubled and witty.
Today I touched one of you for the first time.
You were startled, you ran, you fled away
Fast as a dancer, light, strange, and lovely to the touch.
I reach, I touch, I begin to know you.
domingo, 23 de agosto de 2009
um apocalipse | Joaquim Castro Caldas
Agora é que tinha graça encher campos de selva de soldados e
derrubá-los com os braços, pegar-lhes pelos capacetes e pô-los
nos sítios do globo que nos apetecesse, agarrar no ar obuses e
mísseis e espetá-los una contra os outros, empurrar tanques por
desfiladeiros, desligar centrais nucleares e bombas e amontoar
dinheiro para o derreter e queimar, cobrir o jogo de lágrimas
verdadeiras e conta gotas nos olhos dos homenzinhos armados
em grandes, os que chamam melancolia ao amor e nostalgia
à humildade, os que monopolizam e manipulam a história,
informatizam a eternidade, esquecem-nos ou esquecem-se
Joaquim Castro Caldas, in Mágoa das Pedras
quinta-feira, 20 de agosto de 2009
sábado, 8 de agosto de 2009
sexta-feira, 7 de agosto de 2009
quinta-feira, 6 de agosto de 2009
34#
há sempre uma faca
que corta a onda.
nenhuma onda chega
verdadeiramente ao fim.
morre-se sempre na praia,
contra uma pedra.
e da onda apenas sabemos
o rumor.
AL
terça-feira, 4 de agosto de 2009
sábado, 1 de agosto de 2009
# 4
Gosto de ver a carne tentar novos mapas.
Gosto de contrariar a carne.
AL